19.1.09

Amarcord

"(...) Muitos dizem que na cidade antiga a vida era mais fácil, mais natural e amena e que era bem mais bonita. A cidade cresceu e muita coisa mudou. A velha praça onde todos se reuniam hoje está maior, sem caramanchão, sem trepadeiras, sem obeliscos. Perdeu a antiga magia. Estará mais amiga?
A velha banda, de velhos músicos, deslumbramento da criançada, terá o mesmo destino do coreto antigo, todo em madeira rendilhada, no estilo rococó? Os barzinhos de esquina, com roda de amigos, de bons papos, de cervejinhas, onde rolam estórias de "ouvi contar", será que vão acabar?
A antiga Várzea da minha infância, tantas memórias a registrar, como será amanhã? Fico pensando, rememorando histórias desse lugar e afloram nas minhas lembranças cenas esmaecidas que o tempo não diluiu: crianças, entes queridos, momentos felizes, rostos de amigos, vizinhos, famílias, fragmentos de vivências que aos poucos vão se apagando. De longe, como num sonho, chegam sons, cenas, aromas, que hoje não existem mais: bolinha de gude, umanamula, bilboquê, amarelinha, pula-corda, pique de esconder, queimada, estilingue, empinar pipa, cantigas de roda, lenço atrás, crianças nadando no corguinho, mães ralhando, machado rachando lenha, fumaça na chaminé, medo de puxão de orelha, do "rabo de tatu" atrás da porta, de cobra venenosa, de fantasma, de pegar bicho-de-pé, de ser levada pelo homem e pela mulher do saco, os pobres mendigos Jenjiba e Gabriel Babão. Cheiro de goiabada fervendo no tacho, de doce de leite feito no caldeirão, de pão feito em casa, de torresmo fritando, de rosca de Natal, de jabuticaba , de manga-comum e manga-rosa chupadas em cima do pé. (...)"

(Trecho do artigo "A Cidade e o Sonho", da professora Cármen Cecília Trovatto Maschietto, publicado no DEMOCRATA, 15/3/2008)

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